Também morre quem atira

Por: Henrique Geaquinto Herkenhoff (professor do mestrado em Segurança Pública da UVV) e Fabrício Sabaini (agente de Polícia Federal e mestrando em Segurança Pública)

Fonte: A Gazeta

Data: 04/11/19

Há semanas o noticiário foi tomado por mais uma tragédia de nosso cotidiano: a morte da menina Ághata enquanto voltava para casa com a mãe, no Complexo do Alemão, na Zona Norte do Rio. Na mesma semana, faleceram os policiais Felippe Brasileiro e mais três colegas, aparentemente sem repercussão na mídia, como de resto aconteceu com os 343 representantes do Estado abatidos no cumprimento do dever apenas no ano de 2018.

Claro, podemos ficar aqui discutindo por que até mesmo a morte de criminosos desperta maior interesse jornalístico que a de policiais, mas o assunto é outro.

Chama a atenção um dado específico: as mortes atingem as mesmas camadas sociais e raciais, sejam eles policiais ou não. Quem empunha as armas tem o mesmo histórico e acaba sendo vítima de uma guerra civil entre desfavorecidos. A isso se deve somar o trauma dos profissionais da segurança pública e da população apanhada no fogo cruzado. Quem atira também morre um pouco por dentro.

São, indiretamente, vítimas do próprio Estado, que não pratica uma política pública eficaz para que o combate seja evitado. Muito pelo contrário, utiliza o enfrentamento a tiros em meio urbano como publicidade. E, assim, seguem nas trincheiras da guerra os dois lados da mesma moeda, matando-se em função de missões policiais que raramente trazem mudanças importantes ou duradouras na realidade da violência.

Felizmente, no ES é bem diferente, com uma taxa de letalidade 10 vezes menor, seja entre policiais, seja entre suspeitos e civis. As políticas públicas de maior impacto social já são conhecidas: modernização da investigação, reestruturação institucional das polícias, prisões qualificadas, controle do sistema penitenciário, programas de geração de emprego e renda e tantas outras.

A despeito de resultados sistemáticos e inquestionáveis de uma estratégia que já dura anos, com poucas baixas entre policiais e civis, ninguém parece disposto a seguir o exemplo.

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