Policial federal do DF revela em livro bastidores de casos como o assalto ao Banco Central de Fortaleza
Em 'Agente 114 – O caçador de bandidos', Luiz Antonio da Cruz Pinelli conta detalhes de apreensões de drogas, sequestros e crimes que ficaram conhecidos no país.
Fonte: G1
Data: 09/12/19

Desde 1981 na Polícia Federal, o agente Luiz Antonio da Cruz Pinelli, de 61 anos, perdeu as contas de quantas pessoas prendeu ou de quantas toneladas de drogas foram apreendidas em operações das quais participou. Mas resolveu colocar em um livro os bastidores de algumas das mais famosas investigações da corporação.
Desde 1981 na Polícia Federal, o agente Luiz Antonio da Cruz Pinelli, de 61 anos, perdeu as contas de quantas pessoas prendeu ou de quantas toneladas de drogas foram apreendidas em operações das quais participou. Mas resolveu colocar em um livro os bastidores de algumas das mais famosas investigações da corporação.
Em novembro passado, o morador de Brasilia lançou o livro que traz no título o número de matrícula dele na Polícia Federal. "Agente 114 – O caçador de bandidos". São mais de 250 páginas que resumem quase 40 anos de carreia.
Em entrevista ao G1, o homem lotado na Coordenação-Geral de Repressão a Drogas e Facções Criminosas (CGPRE) da PF, contou – sem dar "spoiler" – detalhes de algumas histórias que envolvem grandes operações.
Maior assalto a banco da história do Brasil
O assalto ao Banco Central de Fortaleza, no Ceará, é considerado o maior assalto a bancos do país. Na madrugada de 5 para 6 de agosto de 2005, ladrões levaram R$ 164 milhões do local – foram mais de 3 toneladas de dinheiro, em notas de R$ 50 .
O crime só foi descoberto depois de mais de 48 horas, em 8 de agosto. Para chegar ao cofre do banco, os assaltantes alugaram uma casa na área central de Fortaleza e cavaram um túnel até o local onde estava o dinheiro.
A passagem tinha cerca de 80 metros de comprimento, 70 centímetros de largura e 3 metros de profundidade. A estrutura levou três meses para ficar pronta e tinha sistema de ar-condicionado e iluminação elétrica.
Luiz Antonio da Cruz Pinelli participou do início das investigações. Ele lembra que o ponto de partida foi um "chip" quebrado, esquecido no túnel.
Por meio do "pedaço de chip", os policiais chegaram a seis celulares. O agente conta que várias ligações foram interceptadas até que, em uma delas, descobriram quem era um dos homens que coordenaram o trabalho de escavação do túnel.
"Ele pediu para comprar 'liguinha'. Desconfiamos e descobrimos que ele estava pedido para comprar elásticos para enrolar o dinheiro. Na casa dele encontramos R$ 12,2 milhões."
Ao final da investigação, mais de 100 pessoas foram denunciadas por furto qualificado, formação de quadrilha e lavagem de dinheiro. Dos R$ 164 milhões furtados, de acordo com Pinelli, R$ 30 milhões em espécie foram recuperados "sem contar os bens confiscados".
O mentor do assalto, conforme a polícia, foi Antônio Jussivam Alves, o Alemão, sentenciado a mais de 100 anos de prisão por diversos crimes, entre eles lavagem de dinheiro e formação de quadrilha.
7,5 toneladas de cocaína
Outra operação lembrada no livro é a apreensão de 7,5 toneladas de cocaína, considerada a maior feita na história da Polícia Federal e a maior do país. Em 1994, a PF deflagou a Operação Alpha, em uma fazenda no município de Guaraí, no Tocantins.
Foram presas 13 pessoas por ligação ao cartel de Cali, na Colômbia, inclusive o proprietário da fazenda, onde a droga foi encontrada. O cartel de Cali foi um dos grupos mais temidos da Colômbia nas décadas de 1980 e 1990, comandado por Miguel Rodríguez Orejuela e Gilberto Rodríguez Orejuela.
As investigações das quais Pinelli participou, apontaram que a organização criminosa agia no Brasil e no exterior desde 1985. Mas em 1989 o cartel intensificou as ações no país, o que chamou a atenção da Polícia Federal.
O agente 114 conta que, junto com colegas, vigiou a fazenda no Tocantins por 45 dias, até o flagrante feito pela PF. A cocaína foi encontrada em contêineres lacrados que seriam embarcados de navio no porto de Santos (SP) para os Estados Unidos.
"Chegamos a ficar camuflados no mato e rastejamos pelo chão para não chamar a atenção. Com todos atrás das grades, pude, finalmente, depois de um mês e meio de campana ininterrupta, curtir uma noite inteira de sono."
O sequestro de Wellington Camargo
O sequestro de Wellington Camargo, em 1998 também está na lista de investigações de Luiz Antonio da Cruz Pinelli. O irmão de Zezé de Camargo e Luciano foi levado da casa onde morava, na noite de 16 de dezembro.
Quatro homens armados entraram na residência, no Jardim Europa, em Goiânia. Os sequestradores fizeram o primeiro contato com a família Camargo cinco dias depois. Não houve negociações.
Na madrugada do dia 13 de março de 1999, os bandidos enviaram a uma emissora de televisão de Goiânia um pedaço da orelha de Wellington e um bilhete, para pressionar a família a pagar o resgate. Após dois dias, exames confirmaram que a orelha era mesmo da vítima.
No livro, o agente conta que a Polícia Federal entrou no caso a pedido do então ministro da Justiça Renan Calheiros. Os trabalhos de inteligência foram montados em três bases: Brasília, Goiânia e São Paulo.
O resgate no valor de US$ 300 mil foi pago em 20 de março. No dia seguinte, Wellington foi deixado dentro de um buraco, a 150 metros de uma estrada vicinal, entre Goiânia e Guapó, na Região Metropolitana.
O irmão da dupla sertaneja saiu do matagal e foi encontrado por dois motociclistas, que o reconheceram. Em 23 de março de 1999, três dias após o pagamento do resgate, sete dos dez acusados de participarem do sequestro foram presos em Campo Grande (MS).
Os outros três integrantes da quadrilha acabaram presos em seguida. Pinelli estava lá.
No livro, o policial federal revela que os irmãos da vítima chegaram a cogitar a hipótese de que Wellington e a então companheira dele tivessem forjado o sequestro, por dinheiro.
"Para agradecer o trabalho da Polícia Federal no caso, Zezé di Camargo e Luciano convidaram todos os agentes e delegados que cuidaram do caso para uma grande festa em Goiânia. Fiz questão de não ir."
A ideia do livro
Segundo o agente da PF, e agora escritor, a ideia de colocar em um livro a carreira policial surgiu em 2012. Na época, ele reuniu fotos, vídeos e documentos do trabalho para elaborar um curso de interdição de aeronaves para policiais.
Depois, ao ler um livro sobre tráfico de drogas, Luiz Antonio da Cruz Pinelli percebeu que havia trechos em que ele era citado como personagem. "Eu vi que eu tinha material e tive uma inspiração", recorda.
Pinelli afirma que dois objetivos o fizeram transformar a carreira do agente 114 em uma história impressa: incentivar os atuais agentes e inspirar a nova geração de policiais. Mas, além disso, ele quis deixar um recado.
"Também quis desestimular os sem vocação, que almejam uma carteira da PF ou apenas uma arma. Eles nos atrapalham – e muito."
Agradecimento a Brasília
Luiz Antonio da Cruz Pinelli nasceu em Maringá, no Paraná. Entrou para a Polícia Federal em 1981, na capital do estado, Curitiba. Em seguida, ele pediu transferência para Campo Grande, no Mato Grosso do Sul, onde trabalhou por 17 anos.
Em Brasília desde 1998, trabalhando na Coordenação-Geral de Repressão a Drogas e Facções Criminosas (CGPRE), Pinelli não esconde a gratidão que tem pela capital. Perto da aposentadoria, ele revelou um desejo.
"Como policial você tem que se adaptar a qualquer lugar. Mas aqui, além de tudo, a cidade é bonita. Eu não vou me mudar de Brasília, aqui vou morrer."