
Wilson Damázio informa, em nota, que cargo está àdisposição do governo (Foto: Katherine Coutinho / G1 PE)
O secretário de Defesa Social de Pernambuco, Wilson Damázio, colocou o cargo à disposição do governador Eduardo Campos, conforme informa nota divulgada por ele, na tarde desta quinta-feira (19). A atitude foi uma resposta à polêmica criada no Recife após as declarações de Damázio para uma entrevista ao Jornal do Commercio, publicada também nesta quinta. A reportagem faz parte de uma série, realizada pela jornalista Fabiana Moraes e publicada ao longo desta semana. Os textos mostraram, a partir do mote dos 80 anos do livro "Casa Grande e Senzala", de Gilberto Freyre, que o abuso de jovens negras e pobres no Recife continua até hoje. Entre os assuntos abordados, havia denúncias sobre estupros cometido por policiais militares.
Entre os trechos da reportagem, Damázio diz que "desvio de conduta a gente tem em todo lugar. Tem na casa da gente, tem irmão que é homossexual, tem outro que é ladrão, entendeu? Lógico que homossexualidade não quer dizer bandidagem, mas foge ao comportamento da família tradicional. Então, em todo lugar tem alguma coisa errada..."
Em outro ponto da entrevista, o secretário de Defesa Social diz que "aqui tem muitos problemas com mulheres, principalmente... Elas às vezes até se acham porque estão com policial. O policial exerce um fascínio no dito sexo frágil... Eu não sei por que é que mulher gosta tanto de farda. Todo policial militar mais antigo tem duas famílias, tem uma amante, duas. Eu sou policial federal, feio pra c**... a gente ia para Floresta [Sertão de Pernambuco], para esses lugares. Quando chegávamos lá, colocávamos o colete, as meninas ficavam tudo sassaricadas. Às vezes tinham namorado, às vezes eram mulheres casadas. Pra ela é o máximo tá dando pra um policial. Dentro da viatura, então, o fetiche vai lá em cima, é coisa de doido."
Entidades afirmaram que vão entrar com representação
contra Damázio no Ministério Público de Pernambuco
(Foto: Luna Markman/ G1)
Na carta divulgada nesta tarde, o secretário diz que as declarações "não constituem meu pensamento nem minha visão do mundo, razão pela qual repilo os termos e peço desculpas a todos aqueles que porventura tenham se sentido ofendidos". Damázio afirma também que "a entrevista que embasou a reportagem foi interrompida em vários momentos, como a própria autora relata, permitindo o desenvolvimento, nesses intervalos, de conversações informais, em tom de brincadeira e termos que, reconheço, foram inapropriados e inadequados".
Repercussão na sociedade civil
Na tarde desta quinta, entidades sociais reuniram a imprensa para pedir o afastamento de Wilson Damázio, por interpretarem "machista" e "homofóbica" as declarações feitas pelo gestor. As organizações também informaram que, nesta sexta (20), entrarão com uma representação no Ministério Público cobrando a responsabilização política, civil e penal de Damázio.
Em nota, as entidades afimam que as declarações do secretário reafirmam "valores machistas e homofóbicos e defendendo, sem nenhum pudor e de forma debochada, o discurso violento de que a culpa é da vítima". "O discurso dele foi no sentido de legitimar e justificar o crime público feito por agentes do estado", pontuou Ana Paula Portela, representante do grupo Direitos Urbanos-Recife.
Uma das representante do Fórum de Mulheres de Pernambuco, Mariana Azevedo, repudiou as declarações de Damázio. "Foi uma violência cometida contra todas as mulheres e mostra também a faceta institucional do machismo. É inadmissível que um profisisonal do alto escalão do governo, indicado pelo governador, continue no cargo. E não é só a figura de Damázio, queremos também que o governo reveja sua política de defesa segurança do estado", disse.
Chopelly Santos [direita] criticou entrevista em nome do
Fórum LGBT (Foto: Luna Markman/ G1)
Representante da coodenação de transsexuais no Fórum LGBT de Pernambuco, Chopelly Santos também criticou a postura do secretário. "O Fórum vê essa atitude abusiva, de uma pessoa que parou no tempo, pois nós também estamos dentro da sociedade, pagamos nossos impostos. Ver o homossexual como desvio de conduta é arcaico. Ele não tem condição psicológica nem estrutural de estar nesse cargo. Esse mesmo secretário já havia dito que 90% dos crimes LGBT não são homofóbicos, mas passionais. Como vai se trabalhar a sensibilização e humanização da polícia com uma cabeça dessa?", questionou.
A enfermeira Eleonora Pereira esteve na reunião, que ocorreu na sede do Gabinete de Assessoria Jurídica às Organizações Populares (Gajop), no bairro de Santo Amaro, área central do Recife. Ela externou a completa insatisfação em relação ao trabalho de Wilson Damázio à frente da SDS. "Eu, como mãe de homossexual, assassinado, repudio e quero que ele se retire, pois não sabe tratar, falar e apoiar esse público", disse.
O filho de Eleonora, José Ricardo, foi assassinado em 2010. Aos 24 anos, o rapaz foi sequestrado na porta de casa e espancado, no bairro de Tejipió, Zona Oeste do Recife, falencendo em um hospital público. Ela explicou que o primeiro inquérito relacionava a causa do crime com envolvimento do jovem com drogas. A delegada envolvida no caso foi afastada e a substituta concluiu que o homicídio teve caráter homofóbico.
Veja, abaixo, a íntegra da nota divulgada pelo secretário de Defesa Social:
"Eu, Wilson Damázio, Secretário de Defesa Social, com relação às declarações a mim atribuídas em reportagem do caderno Cidades do Jornal do Commercio de hoje, dirijo-me à sociedade pernambucana para declarar que as mesmas não constituem meu pensamento nem minha visão do mundo, razão pela qual repilo os termos e peço desculpas a todos aqueles que porventura tenham se sentido ofendidos.
Esclareço ainda que a entrevista que embasou a reportagem foi interrompida em vários momentos, como a própria autora relata, permitindo o desenvolvimento, nesses intervalos, de conversações informais, em tom de brincadeira e termos que, reconheço, foram inapropriados e inadequados.
Reafirmo, por fim, que se as palavras, como é fato, não representam minhas ideias nem minha história de vida, muito menos ainda, podem ser confundidas com as políticas desenvolvidas pelo Governo do Estado que vem revolucionando a Segurança Pública no Brasil com transparências, práticas cidadãs além de total e absoluta intolerância com qualquer conduta contrária aos direitos humanos, à liberdade de expressão e à proteção dos direitos individuais da pessoa humana.
Para proteger o governo e o seu legado, informo que já coloquei o cargo à disposição do governador Eduardo Campos".