G1: Fenapef e entidades nacionais se manifestam contra cortes na Lava Jato

Data: 29/07/17

Segundo o presidente do Sindicato dos Policiais Federais no Distrito Federal e vice-presidente da Federação Nacional dos Policiais Federais, Flávio Werneck, o contingenciamento de verbas anunciado pelo Ministro da Justiça, Torquato Jardim, não foi visto com surpresa pela entidade, mas vai dificultar ainda mais as operações da PF.

O coordenador da força-tarefa da Lava Jato, procurador Deltan Dallagnol, afirmou nesta sexta-feira (28) que a falta de dinheiro para a Polícia Federal já compromete investigações da operação.

O contigenciamento das verbas da PF faz parte de cortes que o governo federal vem fazendo em diversas áreas para tentar conter o rombo nas contas públicas.

Para Dallagnol, a falta de dinheiro produz reflexos nas investigações e impediu que a PF pudesse deflagrar mais etapas da Lava Jato.

"Há uma serie de linhas de investigação que estão paradas ou andando de modo lento, quando elas poderiam já estar avançadas. Veja que das ultimas 7 operações pedidas e deflagradas na Justiça, da Lava Jato, 6 partiram do Ministério Público Federal, apenas uma da Polícia Federal. Se a PF estivesse com recursos humanos, tivesse com uma equipe adequada, nós teríamos em vez de 7, 12 operações, 6 da PF e 6 do MPF", afirmou Dallagnol.

A Polícia Federal tem 473 operações em andamento no país, mas o futuro das atividades da corporação é incerto. O ministro da Justiça, Torquato Jardim, admitiu nesta quinta (27) que a falta de dinheiro do governo deve atingir ações policiais.

"Poderá implicar em um processo seletivo de ações, não realizar todas as operações necessárias e algumas... Não realizar todas as operações necessárias na extensão total, extensão parcial [...] Hoje, a Lava Jato é maior em Brasília do que em Curitiba. São Paulo já está ficando maior do que Curitiba também. Então, é uma redistribuirão de mão de obra, uma redistribuição de meios operacionais, que não significa em hipótese alguma diminuição de capacidade investigativa", afirmou o ministro em entrevista coletiva.

Depois dessa declaração, o ministro do Planejamento, Dyogo Oliveira, afirmou que houve o remanejamento de R$ 2 bilhões para outras áreas, entre elas a Polícia Federal.

Questionada pela TV Globo sobre os recursos para operações, a assessoria do Ministério da Justiça informou que há um repasse mensal de R$ 70 milhões previsto para a Polícia Federal até o final do ano. Disse também que caso haja necessidade de mais recursos, serão realocados de outras operações. "A Lava Jato tem total apoio do ministério", afirmou a assessoria.

O contingenciamento de recursos da Polícia Federal foi de R$ 400 milhões. R$ 170 milhões foram repostos. Além disso, a corporação vai poder contar com os R$ 70 milhões mês a mês prometidos pelo ministério.

'Trabalho perdido'

Investigadores dizem que a lógica das operações é a ampliação - com o avanço das investigações surgem novas provas. E que não garantir as operações é desperdiçar todo o dinheiro já gasto no trabalho de inteligência, escutas e monitoramentos.

Eles também argumentam que interromper os trabalhos é como perder o fio da meada. Como os investigados costumam trocar telefones, endereçoos e redes de relacionamento, as investigações não podem ser interrompidas.

Segundo Carlos Sobral, presidente da Associação dos Delegados da Polícia Federal, a corporação não está iniciando novas investigações para poder usar a verba nas que já estão em curso e são consideradas prioridade.

"A PF hoje, pela falta de recursos, nós estamos sendo obrigados a não iniciar novos trabalhos para canalizar os recursos para as ações prioritárias. Então, para não parar aquelas que estão em andamento, a gente não consegue iniciar novas investigações. E, se nós não tivermos agora recursos para continuar sequer as que já estão em andamento, elas serão paralisadas", afirmou Sobral.

Ele disse ainda que qualquer interrupção nos trabalhos de uma operação, ainda que pequena, é perder anos de trabalho.

"Operação não é algo que você para hoje e volta amanhã. São anos de trabalho, de levantamento, de inteligência, para entender a dinâmica da organização criminosa, da estrutura, do funcionamento do crime organizado que envolve a corrupção. Parar um dia, uma semana, um mês, é perder anos de trabalho", concluiu o presidente da associação.

G1 entrou em contato com a PF e representantes dos policiais nos estados e no Distrito Federal para saber se há efeitos locais no corte de verba. Veja as respostas que recebemos até a última atualização desta reportagem:

DISTRITO FEDERAL

O presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República, José Robalinho Cavalcanti, disse que o contingenciamento não é viável.

“Não é viável que se faça contingenciamento em operações da Polícia Federal. A verba da PF já é muito pequena considerando o ganho que as operações trazem ao país. Principalmente, as operações de combate à corrupção que têm dado um retorno econômico ao Brasil”, disse.

Segundo o presidente do Sindicato dos Policiais Federais no Distrito Federal e vice-presidente da Federação Nacional dos Policiais Federais, Flávio Werneck, o contingenciamento de verbas anunciado pelo Ministro da Justiça, Torquato Jardim, não foi visto com surpresa pela entidade, mas vai dificultar ainda mais as operações da PF.

Em entrevista ao G1, ele disse que o corte de verbas aliado aos problemas de gestão dentro da corporação tem resultado em baixos índices de eficiência nas investigações criminais brasileiras. “Nosso índice é de menos de 10%. Em países como Estados Unidos e Chile, esse índice é de 60%.”

“É um binômio de problemas: falta de verbas e de gestão. Por exemplo, para buscar o ex-ministro da Secretaria de Governo Geddel Vieira Lima e o ex-deputado Rodrigo Rocha Loures, a PF usou o jato da corporação, que gasta R$ 7 mil por hora de voo. Isso é um absurdo. Esse jato é para transportar de 30 a 50 policiais.”

Werneck disse também que o contingenciamento de verbas vai tornar as investigações mais lentas porque os investimentos em tecnologia e inteligência serão reduzidos. “Podem ocorrer prescrições, gerando impunidade.”

Sobre a Lava-Jato, ele afirmou que o impacto maior sofrido pela operação foi o fim da força-tarefa. “A burocracia vai voltar e com ela a morosidade.”

RIO DE JANEIRO

O diretor regional da Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal (ADPF) no RJ, delegado Luiz Carlos de Carvalho Cruz, disse que o contingenciamento de verbas preocupa, mas não surpreende os policiais federais. Segundo ele, desde 2009 os investimentos na PF vêm caindo, ano a ano, e programas como o de Polícia Marítima, essencial para a repressão ao contrabando e ao descaminho de mercadorias, está hoje praticamente parado – a situação se repete no projeto de informatizar o sistema de inquéritos, o que tornaria mais ágil o andamento das investigações. “O piloto começou em 2003, pela delegacia de Florianópolis, mas nunca avançou. Todos os inquéritos da PF ainda são feitos em papel, o que resulta em burocracia e lentidão”.

Também a força-tarefa da Lava Jato pode ser prejudicada, disse Cruz: “Uma operação dessa magnitude é feita com o envolvimento de policiais de todo o país, mas há quase dez anos o valor das diárias pagas ao pessoal de outros estados não é reajustado. Se o orçamento diminuir, com certeza algumas ações da Lava Jato poderão ser afetadas: sem dinheiro para diárias, como requisitar reforço de outras delegacias?”, questiona o delegado, acrescentando que, sem recursos não é possível investir em softwares – e treinamento de pessoal - para filtrar a grande quantidade de informações obtidas nas operações, por meio de quebras de sigilos bancário, fiscal e telemático.

Luiz Carlos Cruz lembra ainda que a cada ano o efetivo da PF diminui e, com menos dinheiro à disposição, não é reposto. Segundo ele, há hoje um déficit de cerca de 600 delegados em todo o país, e de 30% dos servidores que exercem funções administrativas. “A verdade é que está em curso um desmonte velado da Polícia Federal”, disparou.

RIO GRANDE DO NORTE

O presidente do Sindicato, José Antônio Aquino, considerou que o corte prejudica diretamente as operações da Polícia Federal no Rio Grande do Norte. De acordo com ele, hoje atuam por aqui 180 policiais, sendo que há um déficit de 100 agentes.

"Usamos parte dos recursos para trazer policiais de fora, pagando diária, para realizar as operações. Mas agora isso não é possível. Não teremos pessoal suficiente para as operações", explicou. Por questões estratégicas, ele afirmou que não poderia apontar as investigações prejudicadas.

Em junho, a PF do RN deflagrou, junto com o MPF, a Operação Manus (um desdobramento da Lava Jato) que prendeu o ex-presidente da Câmara e ex-ministro Henrique Eduardo Alves, entre outros.

O MPF-RN informou que os cortes atingirão a área administrativa, com renegociação em contratos, como é o caso de aluguel, limpeza e segurança. A atividade-fim não será prejudicada, segundo o órgão.

SANTA CATARINA

Conforme o presidente do Sindicato dos Policiais Federais no Estado de Santa Catarina (Sinpofesc), Carlos Eduardo Taveres, no estado o contingenciamento já afeta as diárias de pagamento de policiais federais.

Ainda segundo Tavares, o atraso de pagamento das diárias tem sido de dois a três dias. Entretanto, o sindicato garantiu que todas as operações estão sendo feitas, já que o prazo para o pagamento é considerado 'aceitável'.

Na segunda-feira (31), haverá uma reunião entre o superintendente da PF e o sindicato para que seja definida como será a situação do próximo mês, já que há previsão de que os cortes sejam mais severos.

SÃO PAULO

O MPF-SP informou que as forças-tarefas que atuam em operações do Ministério Público Federal são prioridades institucionais. Segundo o órgão, elas têm recursos garantidos para o cumprimento de suas funções, definidas em portaria do procurador-geral da República.

"Havendo necessidade de suplementação de recursos, a complementação será realizada a fim de garantir a continuidade das atividades desenvolvidas", disse em nota.

Fonte: G1 com colaboração do G1 DF, G1 RJ, G1 RN, G1 SC e G1 SP.

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