Fenapef aponta as deficiências do modelo investigativo no Brasil, em debate do 10º Fórum Brasileiro de Segurança Pública

Data: 24/09/16

dsc_0022O discurso, quando é corporativista e encerra interesses obscuros, só prospera quando não é confrontado. Isso ficou muito claro no 10º Encontro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, no debate realizado na UNB sobre “Administração de conflitos criminais e justiça penal: quais reformas?” Na mesa de debates coordenada pelo Professor Rodrigo Ghiringhelli, o Vice-presidente da Fenapef, Flávio Werneck - que compartilhou a mesa com o promotor e professor da Uniceub, Bruno Amaral Machado e o Delegado de Polícia Federal Luís Flávio Zampronha -, desconstruiu com didatismo, conhecimento e dados técnicos o argumento levantado na mesa pelo delegado segundo quem é “impossível investigar sem conhecimento jurídico”, pelo fato do crime ser um fato jurídico que deve ser conduzido por quem é bacharel em direito.

Werneck, que estava representando o presidente da Fenapef, Luís Boudens, derrubou o simplismo do argumento do delegado quando apresentou dois levantamentos. De maneira oportuna, aproveitou estudo de 2015 mencionado pelo promotor Bruno Machado e pinçou um número que comprova a falta de efetividade dos inquéritos policiais. A pesquisa realizada pelo próprio Fórum Brasileiro de Segurança Pública mostrou que a Polícia Federal foi responsável por apenas 0,92% da abertura de inquérito policial para crimes de corrupção, um índice por si só modesto, mas que se torna imoral, quando comparado à efetividade de outros órgãos. O TCU, por exemplo, foi a fonte de 39,91% da abertura dos inquéritos, a Receita Federal, de 16,51%, e o Ministério Público Federal, de 12,84%.

O vice-presidente da Fenapef reforçou esse dado com o levantamento do Conselho Nacional do Ministério Público, que revelou um índice muito abaixo daquilo que a sociedade espera para a solução dos crimes: apenas 4%. Uma das explicações para essa vergonha nacional, segundo Werneck, deve-se ao fato de que não é valorizada a multidisciplinariedade. “Para crimes econômicos, financeiros e tributários, se não tivermos excelentes contadores e bacharéis em economia e administração de empresas, não conseguiremos entender a complexidade dos crimes cometidos”, disse ao adentrar no Código de Processo Penal Brasileiro.

“A investigação tem por base e por foco identificar indícios de autoria e de materialidade. Como acontece nas melhores polícias do mundo, temos a necessidade da multidisciplinariedade até por conta da evolução do crime. Para os crimes cibernéticos, por exemplo, em que um bacharel em direito vai auxiliar? Se você não tiver um excelente bacharel em tecnologia da informação, um hacker, você não vai conseguir investigar aquele crime”, explicou, reforçando o termo bacharel para todas as graduações, como que nivelando todas as especialidades à do direito, o que deve enrubescer muitos delegados.

“Precisamos debater na Câmara dos Deputados medidas para a eficiência da segurança pública, acabando com as práticas do inquérito policial que burocratizam a investigação, a fim de prestarmos um serviço de melhor qualidade à sociedade”, sugeriu. Um passo para isso, seria buscar o entendimento em torno do Ciclo Completo de Polícia, no qual todas as polícias poderiam iniciar e terminar a investigação tendo à frente o mesmo policial. Ele observou que se há mudança constante dos investigadores, há o perecimento das provas e do conhecimento, o que leva à impunidade. Para Werneck, o Ciclo Completo dá maior abrangência para que os policiais dentro de sua especialidade investiguem os crimes e acabem com o sistema que existe hoje - um gargalo em que um só cargo retém de maneira improdutiva mais de 10 mil investigações.

Em sua exposição, Flávio Werneck aproveitou também para abordar aspectos e deficiências nas fronteiras e do mal aproveitamento dos recursos humanos dentro da PF. Num recado direto para os que estão somente motivados pela vaidade e pela concentração de poder, disse esperar que “os gestores e políticos não deixem o Brasil se transformar já em 2023 na violenta Colômbia das décadas de 80 e 90, como alertam teóricos e especialistas de segurança pública no país, caso nada seja feito.

Assista a exposição de Flávio Werneck:

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