Agente Federal participa do livro "Constituição, Crise Hídrica, Energia e Mineração na América Latina"

Data: 17/11/16

foto-ramadon-nov-2016O artigo “Mineração: Impactos e Crimes Ambientais”, de autoria do Agente Federal Luis Fernando Ramadon, é parte integrante do livro "Constituição, Crise Hídrica, Energia e Mineração na América Latina", que será lançado hoje (17), às 18 horas, no Salão Nobre da Faculdade de Direito, da Universidade Federal Fluminense (UFF), rua Presidente Pedreira, 62, em Niterói/RJ.

O Agente Federal Ramadon, trabalha há 13 anos na Polícia Federal, tendo chefiado o Núcleo de Operações da Delegacia Regional de Combate a Crimes contra o Meio Ambiente e Patrimônio Histórico (Delemaph) do Rio de Janeiro por três anos. Bacharel em economia e direito e pós-graduado em direito ambiental, o agente federal realizou diversos cursos na área de mineração, sendo um especialista na área.

capa-do-livroO livro "Constituição, Crise Hídrica, Energia e Mineração na América Latina" foi organizado por professores-doutores da Universidade Federal Fluminense (UFF), a partir do curso de Pós-Graduação em Direito Constitucional, a partir do programa voltado para a produção e circulação de obras científicas, que sejam fundamentais para as questões de extrema relevância, seja do ponto de vista teórico-acadêmico, seja do ponto de vista pragmático, visando a gestão e a implementação de agendas vitais no Brasil e na América do Sul.

Confira o artigo:


MINERAÇÃO: IMPACTOS E CRIMES AMBIENTAIS

Luís Fernando Ramadon[1] RESUMO

A Mineração no Brasil desempenha um importante papel tanto nas exportações, principalmente de minério de ferro, tanto na infraestrutura, com o aproveitamento dos recursos minerais para obras do Estado e desenvolvimento das cidades. Entretanto, não existe possibilidade de extração sem um mínimo de dano ao meio ambiente. O Estado então criou leis e normas de forma a minimizar este impacto, inclusive, com a regeneração das áreas degradadas.

A Constituição Federal de 1988 determina que a pesquisa e a lavra de recursos minerais e o aproveitamento dos potenciais de energia hidráulica, somente poderão ser efetuados mediante autorização ou concessão da União, no interesse nacional. (art. 176, § 1º, CF/88).

A importância da abordagem dos crimes ambientais na área de mineração deve-se à própria importância dos minerais para o desenvolvimento do País e a proteção ambiental. Está previsto na Constituição Federal de 1988, que são bens da União os recursos minerais, inclusive os do subsolo. (art. 20, IX, CF/88), competindo-lhe privativamente legislar sobre as jazidas, minas, outros recursos minerais e metalurgia (art. 22, XII, CF/88).

Assim sendo, um dos principais objetivos é a identificação dos crimes ambientais na área da mineração, como o art. 55 da lei 9605/1998, Lei dos Crimes Ambientais, que considera crime "executar pesquisa, lavra ou extração de recursos minerais sem a competente autorização, permissão, concessão ou licença, ou em desacordo com a obtida", com objetivo explícito de proteção ao meio ambiente. Destinado à proteção do patrimônio da União encontramos o previsto na Lei 8.176, de 08 de fevereiro de 1991, que em seu artigo 2º prevê que “constitui crime, na modalidade de usurpação, produzir bens ou explorar matéria-prima pertencentes à União, sem autorização legal ou em desacordo com o título autorizativo”.

 ABSTRACT

Mining in Brazil plays an important role both in exports, mainly iron ore exports, and in infrastructure, with the use of mineral resources for state construction works and development of cities. Nevertheless, there is no possibility of extracting without a minimum of environmental damage. The state then created laws and regulations in order to minimize this impact, including the regeneration of degraded areas.

The Federal Constitution of 1988 states that the prospecting and mining of mineral resources and the use of hydroelectric power can only take place with authorization or concession by the Union, in the national interest. (Art. 176, § 1, CF / 88).

The importance of addressing environmental crimes in the mining area is due to the very importance of the minerals to the development of the country and also to environmental protection. It is envisaged in the Constitution of 1988, that mineral resources, including the basement, are Union goods (Art. 20, IX, CF / 88), so that so the Union is responsible for legislating on deposits, mines, other mineral resources and metallurgy (art. 22, XII, CF / 88).

Thus, a main objective is the identification of environmental crimes in the mining area, as in art. 55 of law 9605/1998, Environmental Crimes Law, which considers as a crime "performing research, mining or extracting mineral resources without the necessary authorization, permission, concession or license, or in violation of the obtained" with the explicit objective of protecting the environment. Destined to the protection of the Union's assets we find the provisions of Law 8,176, from February 8, 1991, which in Article 2 envisages that "it constitutes a crime, in the theft mode, producing goods or exploiting raw materials belonging to the Union without legal authorization or in disagreement with the authorization title."

Palavras-Chave: Mineração. Crimes Ambientais. Crimes Minerários. Departamento Nacional de Produção Mineral. DNPM. DELEMAPH. Extração Mineral. Degradação Ambiental. Usurpação.

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INTRODUÇÃO

A mineração é considerada pelo setor de extração mineral, como a base da sociedade industrial moderna, ao fornecer matéria-prima para todos os setores da economia. Por outro lado, por se tratar da extração de recursos naturais não renováveis, a mineração geralmente é vista como uma atividade altamente impactante e não sustentável. Os efeitos ambientais e socioeconômicos do aproveitamento das jazidas minerais dependem, principalmente, da forma na qual esta atividade será planejada e desenvolvida.

Considerada de utilidade pública, a mineração tem sua atividade controlada e autorizada pela União, a quem compete administrar os recursos a indústria, o consumo e o comércio dos bens minerais, através do Departamento Nacional de Produção Mineral, DNPM, cujas normas são regulamentadas pelo Código de Mineração (Decreto Lei 227, de 28/02/1967).

Os principais danos ambientais serão apresentados no Capítulo 1, sendo reconhecidos como de grande impacto a Degradação de praias, rios e lagoas; as alterações dos cursos hídricos; o aumento do assoreamento e a descaracterização do relevo com erosão do solo; a destruição de áreas de preservação permanente, da flora e da fauna; a poluição atmosférica.

Entretanto, a extração mineral se torna muito mais impactante e degradante quando ocorre de forma ilegal e criminosa, pois não existe nenhum tipo de controle ou fiscalização. Desta forma, no Capítulo 2 serão apresentados os crimes ambientais na mineração, o Modus Operandi desses crimes e como o Estado protege o meio ambiente diante da extração mineral ilegal e também apurar quais os mecanismos de prevenção.

CAPÍTULO 1 - IMPACTOS AMBIENTAIS PROVOCADOS PELA EXTRAÇÃO MINERAL

Ao longo de muitas décadas a extração mineral têm se firmado como uma atividade que, além de gerar empregos e ser fonte extra de renda para pequenos proprietários rurais, sobretudo nas localidades onde não há desenvolvimento ou perspectivas de melhoria social, também é uma atividade que causa enormes impactos ambientais, muitos destes irreversíveis.

A exploração mineral em si, já é uma atividade não sustentável, ou seja, o que foi extraído nunca mais será reposto, e existem procedimentos que têm que ser utilizados para minimizar o impacto ambiental da atividade, como cobertura vegetal, preservação de cursos d'água e da paisagem, manutenção da flora e da fauna da região, controle sobre poluição sonora e disposição de rejeitos, etc.

Os efeitos ambientais estão associados, de modo geral, às diversas fases de exploração dos bens minerais, como à abertura da cava, (retirada da vegetação, escavações, movimentação de terra e modificação da paisagem local), ao uso de explosivos no desmonte de rocha (sobre pressão atmosférica, vibração do terreno, lançamento de fragmentos, gases, poeira, ruído), ao transporte e beneficiamento do minério (geração de poeira e ruído), afetando os meios como água, solo e ar, além da população local.

De acordo com Bruno Feigelson[2], de forma a minimizar os efeitos desses impactos foi assinada a Portaria 104/2009, do DNPM, IBAMA e ICMBio, considerando-a como “a materialização dos esforços conjuntos para compatibilizar os princípios de exploração geológica e preservação ambiental”.

Essa portaria criou o Comitê Permanente de Mineração e Meio Ambiente – CP/MIMA, que é um órgão colegiado consultivo, criado com o objetivo de avaliar, monitorar, elaborar e aplicar atos normativos com vistas a solucionar conflitos entre gestões dos recursos minerais e dos recursos ambientais no interesse público, social e econômico.

Não há como parar a exploração mineral uma vez que seus produtos são de grande importância para a sociedade. O grande desafio é explorá-los com responsabilidade e sustentabilidade, sem degradar o meio ambiente, ou ao menos minimizar estes impactos. E, para que isso ocorra é preciso haver uma conscientização do empreendedor de que é perfeitamente possível o desenvolvimento da mineração dentro de um conceito de sustentabilidade onde o mínimo de agressão ao ecossistema e o melhor aproveitamento dos recursos minerais, são a base para prevenir futuras penalizações dos órgãos competentes, melhorar seu desempenho ambiental e garantir um meio ambiente ecologicamente equilibrado para todos.

Alguns danos ambientais provocados pela exploração mineral são: alterações dos cursos d'água; aumento do teor do material sedimentado em suspensão, promovendo assoreamento; desmatamento; descaracterização do relevo; formação das cavas; assoreamento de cursos d'água, presentes; destruição de áreas de preservação permanente; destruição da flora e fauna; Alteração do meio atmosférico (aumento da quantidade de poeira no ar); Alteração dos processos geológicos (erosão), entre outros.

A atividade de mineração também contribui para a poluição de parâmetros de qualidade das águas como o orgânico, proveniente dos esgotos do sistema de apoio das atividades, tais como vilas, residências, escritórios; os óleos e detergentes provenientes das oficinas, máquinas, caminhões; o cianeto/mercúrio resultado do beneficiamento dos minérios de ouro; e as águas ácidas e/ou alcalinas.

As principais fontes de poluição do ar são por particulados produzidos em virtude da detonação de rochas, movimentação de caminhões e máquinas, ação de ventos nas frentes de lavra, britagem e moagem por ocasião da etapa de beneficiamento dos minérios; e poluentes gasosos, geralmente provenientes da combustão de óleos combustíveis.

As fontes de ruídos existentes nas minerações são as detonações, compressores, britadores, moinhos, bombas, locomotivas, tratores, caminhões, ventiladores, exaustores.

As principais fontes de vibração são as detonações para desmonte de rochas. Outras fontes de menor intensidade são os britadores, máquinas pesadas de terraplanagem, peneiras vibratórias.

1.1 Mineração em Área de Preservação Permanente - APP

Em relação à destruição de Área de Preservação Permanente - APP, pela extração mineral, ela ocorre em função da permissão para essa exploração. Segundo Romeu Thomé[3] “Todavia, excepcionalmente, poderá haver a supressão da vegetação de uma APP, nos casos de utilidade pública e interesse social, ou nas hipóteses de baixo impacto ambiental (art. 8º da Lei 12.651/2012)”.

Para Bruno Feigelson[4] a mineração é uma das hipóteses de utilidade pública, podendo assim, haver mineração em APP, “a intervenção ou supressão de vegetação nativa em área de preservação permanente somente ocorrerá nas hipóteses de utilidade pública – que é o caso da mineração -, interesse social ou de baixo impacto ambiental”.

Essa “permissão” também ocorre em função do pressuposto que só é possível minerar em locais onde existem jazidas, sendo esses recursos minerais, estáticos, fixados no subsolo. Obviamente, essa exploração só poderá ocorrer se não houver alternativas técnico-espaciais e com a realização dos relatórios e estudos de impacto ambiental (EIA-RIMA), aprovados pelo Departamento Nacional de Produção Mineral – DNPM.

O próprio Conselho Nacional de Meio Ambiente - CONAMA, através de sua Resolução 369, de 28 de março de 2006, enumerou algumas hipóteses de utilidade pública, no qual o órgão ambiental competente pode autorizar a intervenção ou supressão de vegetação em Área de Preservação Permanente - APP. A alínea “c”, do item “1”, do artigo segundo, desta Resolução, configura como utilidade pública “as atividades de pesquisa e extração de substâncias minerais, outorgadas pela autoridade competente, exceto areia, argila, saibro e cascalho”.

CAPÍTULO 2 - CRIMES AMBIENTAIS NA MINERAÇÃO

De acordo com a Constituição Federal de 1988, artigos 20 e 176, à União Federal cabe a propriedade dos bens minerais existentes em seu solo e subsolo.

O artigo 176, especificamente diz que as jazidas, em lavra ou não, e demais recursos minerais e os potenciais de energia hidráulica constituem propriedade distinta da do solo, para efeito de exploração ou aproveitamento, e pertencem à União, garantida ao concessionário a propriedade do produto da lavra.

O Parágrafo 1º diz que a pesquisa e a lavra de recursos minerais e o aproveitamento dos potenciais a que se refere o caput deste artigo somente poderão ser efetuados mediante autorização ou concessão da União, no interesse nacional, por brasileiros ou empresa constituída sob as leis brasileiras e que tenha sua sede e administração no País, na forma da lei, que estabelecerá as condições específicas quando essas atividades se desenvolverem em faixa de fronteira ou terras indígenas.

O Parágrafo 2º diz que é assegurada participação ao proprietário do solo nos resultados da lavra, na forma e no valor que dispuser a lei. E o Parágrafo 3º diz que a autorização de pesquisa será sempre por prazo determinado, e as autorizações e concessões previstas neste artigo não poderão ser cedidas ou transferidas, total ou parcialmente, sem prévia anuência do poder concedente.

O artigo 23 e seu inciso XI, diz que é também competência da União registrar, acompanhar e fiscalizar as concessões de direitos de pesquisa e exploração de recursos hídricos e minerais em seus territórios. O Parágrafo 2º do artigo 225, diz que aquele que explorar recursos minerais fica obrigado a recuperar o meio ambiente degradado, de acordo com solução técnica exigida pelo órgão público competente, na forma da lei.

No caso do setor mineral, a extração desses bens acarreta uma grande transformação com consequente degradação ambiental. De forma a proteger, regulamentar e minimizar seus efeitos, com objetivo explícito de proteção ao meio ambiente, o legislador insculpiu na Lei dos Crimes Ambientais, lei 9605/1998, no art. 55, que é considerado crime executar pesquisa, lavra ou extração de recursos minerais sem a competente autorização, permissão, concessão ou licença, ou em desacordo com a obtida. Incorre nas mesmas penas quem deixa de recuperar a área pesquisada ou explorada, nos termos da autorização, permissão, licença ou concessão ou determinação do órgão competente. A pena prevista para esse crime é detenção de seis meses a um ano e multa.

O objetivo dessa lei é, sobretudo, a proteção ambiental e a preservação da natureza em todos os elementos essenciais à vida humana e para a manutenção do equilíbrio ecológico, visando tutelar a qualidade do meio ambiente em função da qualidade de vida como uma maneira de resguardar o direito fundamental da pessoa humana.

Por outro lado, foi por meio da tipificação da conduta daquele que explora ilegalmente matéria-prima pertencente à União, e por considerá-la antijurídica, é que o Poder Público resolveu proibir o ataque ao seu patrimônio, como se extrai da Lei nº 8.176, de 08/02/1991, que em seu artigo 2º prevê que “constitui crime, na modalidade de usurpação, produzir bens ou explorar matéria-prima pertencentes à União, sem autorização legal ou em desacordo com o título autorizativo”. A pena estipulada é detenção de um a cinco anos e multa. O Parágrafo primeiro estabelece: “Incorre na mesma pena aquele que, sem autorização legal, adquirir, transportar, industrializar, tiver consigo, consumir ou comercializar produtos ou matéria-prima, obtidos na forma prevista no caput deste artigo”.

A lei 8.176/91, é um “diploma normativo que definiu os crimes contra a ordem econômica, também merece destaque tendo em vista sua relevância para o estudo das sanções no Direito Minerário” [5].

É importante ressaltar que o sujeito ativo das condutas criminais em comento responde, em concurso formal, pela prática dos crimes de usurpação de bem público e contra o meio ambiente, isso em razão da distinção dos bens jurídicos atingidos.

Haverá concurso formal, de acordo com o artigo 70 do Código Penal, quando “o agente, mediante uma só ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não, aplicasse-lhe a mais grave das penas cabíveis ou, se iguais, somente uma delas, mas aumentada, em qualquer caso, de um sexto até metade” [6] se da extração sobrevier dano (art. 163 do Código Penal), crime contra a flora (arts. 38, 40 e 44 da Lei 9.605/98), poluição (art.54 da Lei 9.695/98) ou perecimento da fauna (art. 33 da Lei 9.605/98). Sendo “crime comum, de mera atividade, de ação múltipla, de forma livre, comissivo ou omisso (parágrafo único do art. 55), admitindo-se a tentativa”.

O art. 55 tem “por objetividade jurídica o equilíbrio do ecossistema, através da proteção dos recursos minerais. Trata-se de conduta conhecida como mineração clandestina”.

Assim sendo, como a Lei de Crimes Ambientais tutela bens jurídicos distintos, a saber, o Meio Ambiente e o Patrimônio e a Fé Pública, não há que se falar em aplicação do princípio da especialidade ou consunção para sanar conflito aparente de normas, mas sim em concurso formal (art. 70 CPB).

O STJ tem adotado tal entendimento em discussão análoga. Confira-se:

“Não existe conflito aparente de normas entre o delito previsto no art. 55 da Lei n.º 9.605/98, que objetiva proteger o meio ambiente, e o crime do art. 2.º, caput, da Lei n.º 8.176/91, que defende a ordem econômica, pois tutelam bens jurídicos distintos, existindo, na verdade, concurso formal. Precedentes” (HC 149.247/SP, DJe 07/02/2011).

Ademais, a aplicação das sanções penais ambientais tem como objetivo elementar, assegurar a todos os brasileiros e estrangeiros residentes do país o direito constitucional ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.

Desta forma, nas hipóteses de extração ilegal de recursos minerais, o posicionamento dominante é no sentido da existência de dois crimes (art. 55, Lei 9605/08 e art. 2º, Lei 8.176/91), em concurso formal (art. 70, CP).

Assim, a Constituição Federal também inovou, ao prever a possibilidade da lei infraconstitucional contemplar os crimes ambientais cometidos por pessoas jurídicas.

Para a aplicação da responsabilidade da pessoa jurídica é imprescindível alguns requisitos primordiais, quais sejam, que a conduta individual tenha sido praticada no interesse da pessoa jurídica; que essa conduta individual não esteja à margem do âmbito de atividade da empresa; que a conduta seja cometida por pessoa diretamente ligada à pessoa jurídica e; que a prática da conduta tenha o auxílio do poderio da pessoa coletiva.

Assim está descrito no artigo 3° da Lei 9.605/98, in verbis:

Artigo 3° - As pessoas jurídicas serão responsabilizadas administrativa, civil e penalmente, conforme o disposto nesta Lei, nos casos em que a infração seja cometida por decisão de seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado, no interesse ou benefício da sua entidade. Parágrafo único. A responsabilidade das pessoas jurídicas, não excluí a das pessoas físicas, autoras, coautoras ou partícipes do mesmo fato.

Entretanto, apesar de termos a criminalização da extração mineral ilegal no art. 55 da Lei de Crimes Ambientais e a Usurpação no art. 2º da Lei 8.176/91, também podemos considerar como crimes relacionados à extração mineral ilegal, uma série de outros, tais como: Fraudes na concessão/obtenção de permissões e licenças; Obtenção de títulos autorizativos sobre uma determinada área particular, ainda que de forma regular, com o único escopo de “esquentar” a produção; Falsificação ou adulteração de notas fiscais; Corrupção de servidores do DNPM e de órgãos ambientais, tanto na concessão dos títulos autorizativos, como na emissão de licenças; Engenheiros, geólogos e demais consultores técnicos que utilizam seus conhecimentos para a obtenção de títulos autorizativos ideologicamente falsos; lavagem de dinheiro, entre outros que se encontram relacionados na tabela a seguir.

Tabela 1. Conduta Delituosa e Punição.

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Existe também a possibilidade de apresentação de relatório de pesquisa mineral ideologicamente falso, pois está insculpido no o artigo 22, inciso V, do Decreto-Lei n. ° 227, de 28 de fevereiro de 1967, com redação dada pela Lei n. ° 9.314/1996, que o titular da autorização fica obrigado a realizar os respectivos trabalhos de pesquisa, devendo submeter à aprovação do DNPM, dentro do prazo de vigência do alvará, ou de sua renovação, relatório circunstanciado dos trabalhos, contendo os estudos geológicos e tecnológicos quantificativos da jazida e demonstrativos da exequibilidade técnico-econômica da lavra, elaborado sob a responsabilidade técnica de profissional legalmente habilitado.Importante ressaltar, que nesse crime de lavagem de dinheiro (item 19, do quadro anterior) uma das características básicas é a utilização de uma pessoa jurídica para "esquentar" o negócio criminoso. O lavador paga seus impostos em dia, tem funcionários com CTPS assinada, emite notas fiscais e está sempre em dia com suas obrigações. Dessa forma, consegue dissimular a origem de todo o capital. Na mineração, a origem do dinheiro é a extração criminosa de areia.

Há situações em que o minerador apresenta esse relatório circunstanciado falso ou enganoso, inclusive por omissão, oportunizando angariar recursos (sociedades de capital aberto) e/ou lavra posterior ilegal.

2.1 - Modus Operandi

Normalmente os crimes ambientais na área da mineração, ocorrem pela degradação da área explorada, tanto de forma legal, quanto de forma ilegal. Quando ela ocorre de forma legal, significa que o minerador cumpriu todos os requisitos do Departamento Nacional de Produção Mineral - DNPM, solicitando inicialmente a Autorização de Pesquisa e iniciando a pesquisa dentro do prazo estabelecido (sessenta dias); se não for o proprietário da área, fez o acordo com o superficiário, que pode ser o dono ou posseiro; No final da pesquisa fez o Relatório que sendo aprovado, fez o requerimento de lavra; e assim, apresentou todas as licenças ambientais; teve a outorga de lavra; explorou toda a jazida; mas não recuperou a área degradada pela exploração, durante ou após o encerramento das atividades.

Outra situação se refere ao minerador que está com sua outorga legal e posteriormente começa a extrair fora da poligonal. E quando ocorre a fiscalização ele denuncia terceiros pela extração irregular.

Quando a extração ocorre de forma ilegal, os crimes acontecem quando o criminoso com seu maquinário e caminhões, extrai o material como areia, por exemplo, de leito de rios, praias, ou saibro ou granito de morros ou elevações em áreas de proteção ou não, podendo ser em áreas públicas ou privadas e deixam a área totalmente degradada. Para isso se utilizam de força para expulsar os moradores ou posseiros, através de milícias que protegem o “negócio”.

O Estado, em razão de obras públicas de engenharia, se tornou um dos grandes responsáveis, por exemplo, pela extração ilegal de minério para uso imediato na construção civil. Em certas ocasiões, existe apenas uma licença ambiental para a extração, emitida pela Secretaria de Estado do Meio Ambiente, mas não há qualquer título autorizativo do Departamento Nacional de Produção Mineral – DNPM.

Entretanto, cabe ressaltar, que não é só no Brasil que existe extração ilegal. Uma reportagem publicada pelo jornal “O Globo”, intitulada “Impactos da Mineração, até o último grão de areia”[7], dá a dimensão do crime globalizado.

Segundo Flavia Milhorance, na Índia, a extração ilegal de areia é controlada por uma organização criminosa, cuja máfia é a mais articulada do país, com ocorrência de 300 assassinatos nos últimos 5 (cinco) anos. Já foram retirados do lago Vembanad, com um comprimento de 96,5 Km e com 14 Km de largura, em 2.033 Km2, cerca de 12 milhões de toneladas de areia, com uma redução de sua superfície de 10 cm a cada ano.

No Marrocos, a extração ilegal ocorre entre os 125 km que separam as cidades litorâneas de Safi e Essaouira, com uma exploração de 15 toneladas anuais.

“Organizações criminosas também roubam areia de praias da Indonésia, Camboja e Malásia e levam o material para Cingapura, no que ficou conhecido como o “fornecimento da meia-noite”, em alusão ao horário da extração”. Esse quadro se traduz no roubo de 517 milhões de toneladas nos últimos 20 anos, devido ao ritmo acelerado de crescimento de Cingapura.

Em 2008, toneladas de areia foram roubadas de Coral Springs, na Jamaica, acabando com a praia. Há registros também em Cabo Verde, onde a extração de areia é proibida.

Segundo o UNEP, Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, o consumo global é de cerca de 40 bilhões de toneladas por ano, com cerca de bilhões de toneladas usadas para fazer concreto.

2.2 - Apuração dos Crimes

Depois de serem apresentados neste trabalho, o sistema mineral e o modus operandi para a perpetração de crimes, chega-se à vez das para o combate a esses crimes, e as instituições que promovem esse combate.

Entendo que, como políticas preventivas, um dos principais instrumentos de combate aos crimes ambientais na mineração é o que se chama de inteligência estratégica. Pode-se dizer que esse conhecimento de inteligência é a resultante da obtenção, análise, interpretação e disseminação de conhecimento sobre a estrutura minerária, no que se refere a uma possível projeção para o futuro.

A tarefa de produzir conhecimento corresponde à parte ativa da atividade de inteligência. A produção deste conhecimento é orientada pela metodologia de produção de conhecimento estabelecida na doutrina brasileira de inteligência.

E para esse combate, é necessário que o Estado tenha instituições fortes e que a sociedade tenha entidades constituídas de forma a colaborar com a denúncia desses crimes.

2.2.1 – Departamento Nacional de Produção Mineral - DNPM

O órgão que tem a missão de gerenciar o patrimônio mineral brasileiro de forma sustentável, utilizando instrumentos de regulação em benefício da sociedade é o Departamento Nacional de Produção Mineral – DNPM, criado pela Lei nº 8.876/94 e vinculado ao Ministério de Minas e Energia. Trata-se de uma autarquia federal e, portanto, é dotado de personalidade jurídica de direito público, com autonomia patrimonial, administrativa e financeira.

As atribuições do DNPM[8] são: Promover o planejamento e o fomento da exploração mineral e do aproveitamento dos recursos minerais; Superintender as pesquisas geológicas, minerais e de tecnologia mineral; Assegurar o acesso ao bem mineral, por meio da outorga de títulos que autorizam a exploração e o aproveitamento de substâncias minerais no país; Assegurar, controlar e fiscalizar o exercício das atividades de mineração em todo o território nacional; Fiscalização e controle de emolumentos; Taxa Anual por Hectare - TAH e Compensação Financeira pela Exploração Mineral - CFEM; Proteção do patrimônio fossilífero.

Diante dos atos de ilegalidade da empresa, em fiscalização pelo Departamento Nacional de Propriedade Mineral – DNPM, se constatada na oportunidade a atividade latente de lavra ilegal, é imitido Auto de Paralisação e Interdição e, caso haja minério pronto para beneficiamento e/ou comercialização, é lavrado, também, Auto de Apreensão.

Constatando o DNPM a existência de indícios de extração ilegal, mesmo se não emitidos os referidos autos, é encaminhado o relatório à Procuradoria da União, Ministério Público Federal e Polícia Federal. Órgãos constitucionalmente competentes a investigar e/ou exigir judicialmente o cumprimento de penalidades e ressarcimento ao erário dos danos ambientais e minerais decorrentes.

2.2.2 – Delegacia de Repressão aos Crimes Contra o Meio Ambiente e Patrimônio Histórico – DELEMAPH

Do ponto de vista estratégico, a criação de uma unidade especializada no âmbito da Polícia Federal para combater e reprimir os crimes praticados em detrimento do meio ambiente e do patrimônio histórico revestiu-se de importância inquestionável. A par da complexidade que envolve muitas investigações, percebe-se, sistematicamente, nas operações levadas a efeito pelas DELEMAPHs, o concurso de crimes de corrupção, formação de quadrilha, falsidade ideológica, entre outros. Isso exige constante aperfeiçoamento e conhecimento do tema.

Na repressão aos crimes contra o meio ambiente é fundamental o estabelecimento de parcerias com diversos órgãos e instituições que atuem na área, como o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), o Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), dentre outros.

2.2.3 – Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMA

O IBAMA foi criado por meio da Lei nº 7.735, de 22 de fevereiro de 1989. Trata-se de autarquia federal dotada de personalidade jurídica de direito público, autonomia administrativa e financeira, vinculada ao Ministério do Meio Ambiente – MMA. O IBAMA surgiu da fusão de quatro órgãos: o Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal - IBDF, que mantinha a gestão das florestas; a Superintendência de Pesca – SUDEPE, que mantinha a gestão do ordenamento pesqueiro; a Superintendência da Borracha - SUDHEVEA, a qual tinha como desafio viabilizar a produção da borracha; e, por fim, Secretaria Especial de Meio Ambiente - SEMA, que fazia o trabalho político e de gestão ambiental.

2.2.4 – Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade - ICMBio

O ICMBio ou Instituto Chico Mendes foi criado através da Lei nº 11.516, de 28 de agosto de 2007. É o mais novo órgão ambiental do governo brasileiro. Trata-se de autarquia federal, dotada de personalidade de direito público, autonomia administrativa e financeira, vinculada ao Ministério do Meio Ambiente.

2.2.5 – Conselho Nacional do Meio Ambiente - CONAMA

O CONAMA foi instituído pela Lei nº 6.938/81, que define a Política Nacional do Meio Ambiente. É o único Conselho que tem o poder de legislar, suas resoluções, portanto, têm força de Lei.

Principais Resoluções do Conama: Resolução nº 237/1997 – regulamenta aspectos de licenciamento ambiental; Resolução nº 303/2002 – definição e limites da área de preservação permanente; Resolução nº 369/2006 – casos excepcionais que possibilitam a intervenção ou supressão de vegetação em áreas de preservação permanente.

2.2.6 - Terceiro Setor

É composto por organizações não-governamentais, entidades de classe, associações profissionais, sindicatos, movimentos sociais. No artigo 5º, incisos XVI a XXI, da Constituição Federal estão os fundamentos para o desenvolvimento do Terceiro Setor.

CONCLUSÃO

Diante do exposto, percebe-se a dicotomia entre a necessidade real da extração mineral com a proteção do meio ambiente. O Estado deve ter os instrumentos de controle fortalecidos. Entretanto, identifica-se que a legislação atual deve sofrer ajustes com a finalidade de inibir a fraude e punir, com mais rigor, os criminosos estelionatários que praticam tais crimes, sejam estes servidores públicos ou não.

O Estado, através de seus entes de controle e de investigação, Departamento de Polícia Federal, Departamento Nacional de Produção Mineral, IBAMA, e Secretarias estaduais ambientais devem sempre estar um passo à frente da criminalidade e não somente em busca dos novos mecanismos de combate às fraudes que são criadas constantemente. Não se pode mais permitir o “enxugamento de gelo” ou a inércia por parte das autoridades, mas criar mecanismos para se fechar os buracos deste “queijo suíço”.

O estímulo e a qualificação permanente dos recursos humanos envolvidos nessa área, somados aos recursos modernos e necessários para o serviço de inteligência, deve embasar qualquer política de governo, de forma a minimizar os malefícios causados à sociedade brasileira e aos cofres públicos por estes crimes.

A criação de uma Força Tarefa pode ser resultante destes esforços, com a participação do Departamento Nacional de Produção Mineral, DNPM, Departamento de Polícia Federal – DPF, Ministério Público Federal – MPF, entidades públicas de meio ambiente e organizações do terceiro setor. A produção de resultados com minimização de esforços foi o objeto desta solução. De estrutura inteligente e com ação rápida e forte, a estratégia pode gerar resultados positivos, mas a falta de recursos humanos prejudicará os potenciais resultados.

Os conceitos de estratégia, eficiência, eficácia, delegação, coordenação, método, planejamento e planejamento estratégico devem estar presentes em quase todas as fases das operações e investigações, permitindo economia de tempo e de recursos financeiros para o erário.

Há de se considerar que existem outras formas de combate à corrupção e talvez com mais resultados práticos, que seriam os instrumentos de controle que resultassem em punição efetiva, como o cumprimento de metas do Conselho Nacional de Justiça, CNJ, que pede aos tribunais que julguem todos os quase 75.000 (setenta e cinco mil) processos contra a administração pública e de improbidade administrativa, distribuídos ao Superior Tribunal de Justiça, STJ, à Justiça Federal e aos estados.

Entendo que, além do aumento das penas, o combate à corrupção requer, além dos mecanismos de controle e mudanças no sistema, a rapidez com que os réus serão julgados e a garantia que serão punidos, pois assim, o fraudador recuará, se tiver certeza que será rapidamente julgado, condenado e de fato, cumprir a pena.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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THOMÉ, Romeu. Manual de direito ambiental. 4ª ed. Salvador: Editora Jus Podivm, 2014.

[1] Luís Fernando Ramadon é Agente de Polícia Federal, Bacharel em Direito e Ciências Econômicas, e com Pós-Graduação em Direito Ambiental, com a monografia “Crimes Ambientais na Área da Mineração”.

[2] FEIGELSON, Bruno. Curso de direito minerário, p. 71.

[3] THOMÉ, Romeu. Manual de direito ambiental, p.516.

[4] FEIGELSON, Bruno. Curso de direito minerário, p. 149.

[5] FEIGELSON, Bruno. Curso de direito minerário, p.291.

[6] THOMÉ, Romeu. Manual de direito ambiental, p.673.

[7]http://oglobo.globo.com/sociedade/sustentabilidade/base-da-construcao-civil-areia-um-dos-recursos-mais-valiosos-explorados-do-mundo-14960573.

[8] www.dnpm.gov.br

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