Reforma Administrativa e ataques ao servidor desviam foco da frágil performance econômica do País
Luís Antônio Boudens
Fonte: Comunicação Fenapef
Data: 24/05/21
Não é responsabilidade do servidor público brasileiro a má situação econômica do Brasil. Não será a quarta granada colocada nos bolsos desses trabalhadores a solução para a crise, o desemprego, o desamparo. Quando uma autoridade que tem o dever de apresentar um plano de ação – qualquer plano de ação – para fazer o País avançar, dedica sua energia e esforços a agredir uma categoria, algo de muito errado se desenha no cenário.
É fácil dizer que o Brasil é hoje um dos países que mais ‘gastam’ com o pagamento de salários e dizer que, na média, o trabalhador público ganha muito. No bolo total para calcular essa média, estão incluídos militares, juízes, membros do Ministério Público e parlamentares. Os mesmos que, estranhamente, não serão afetados pela reforma proposta pelo ministro da Economia.
O ônus e o sacrifício ficam, portanto, para quem esteve na linha de frente do combate à pandemia desde o início – aí incluídos professores, profissionais de saúde e da segurança pública – que seguiram trabalhando mesmo com risco de suas próprias vidas. Vale lembrar que médicos, enfermeiros, professores e policiais estão entre as categorias profissionais com maiores índices de contaminação pela Covid-19 entre os servidores.
A Reforma Administrativa proposta pelo governo não traça qualquer cenário sobre os problemas do serviço público. Não há diagnóstico. Há ataques. Então o ministro da Economia, Paulo Guedes, se dedica diuturnamente a encontrar adjetivos jocosos para (des)qualificar o servidor público. Simultaneamente, apresenta ao Congresso, para debate, uma proposta de Emenda Constitucional, a PEC 32/20 com problemas tão sérios em sua concepção que tem dificuldade de avançar.
O relatório apresentado pelo deputado Darci De Matos (PSD-SC) à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados sugere a exclusão de dois pontos, por inconstitucionalidade. Um deles define que o presidente da República poderá criar e extinguir autarquias e fundações. O outro diz que servidores de carreiras típicas de Estado não poderão exercer qualquer outra atividade remunerada.
Mas não há uma observação sobre questões muito sérias: por exemplo, a PEC 32 criará situações insustentáveis dentro do serviço público. É só imaginar uma repartição pública onde parte dos servidores terá direito a garantias como a estabilidade e outra não. Ou uma corporação onde “trainees” terão acesso a informações que deveriam ser protegidas pelo sigilo, mas que poderão ser tranquilamente compartilhadas caso o funcionário deixe de fazer parte do quadro.
A Reforma Administrativa parece vital para o futuro profissional do ministro da Economia. A vocação reformista de Paulo Guedes desconsidera o papel dos servidores públicos para o Brasil. Ele confunde servidor com militante, quando é justamente o contrário: sem concurso, a máquina pública ficaria à mercê do aparelhamento de qualquer governo e o interesse público seria substituído por interesse do governante da vez.
Defender o serviço público é bem mais do que defender uma categoria. É defender o direito do cidadão brasileiro a ser, de fato, atendido em suas demandas – inclusive as mais básicas, preconizadas pela Constituição brasileira: saúde, educação, emprego. Quando defende os direitos dos policiais federais, a Federação Nacional dos Policiais Federais (Fenapef) defende o direito do brasileiro à segurança. Uma segurança pública eficiente depende, principalmente, de homens e mulheres que trabalhem por ela. Esses homens e mulheres são servidores públicos, que assumiram suas funções por força de aprovação em concurso público e que se arriscam todos os dias. Integram o quadro de carreiras típicas de Estado porque suas funções são muito específicas: não há jornada definida, há esquemas de plantão e sobreaviso, os profissionais estão sujeitos a risco de vida, precisam andar armados, entre outras atribuições.
Por todos esses problemas, a Fenapef prega o voto NÃO à PEC 32/20.
Artigo originalmente publicado no Correio Braziliense em 22 de maio de 2021