Boudens fala sobre razões dos protestos dos policiais

Fonte: CartaCapital

Data: 17/03/21

A insatisfação dos policiais com o governo federal fez com que o presidente Jair Bolsonaro perdesse em torno de 40% do apoio que tinha dos profissionais de segurança pública.

A estimativa é feita pelo presidente da Federação Nacional dos Policiais Federais (Fenapef), Luís Antônio Boudens, em conversa com Carta Capital.

De acordo com Boudens, Bolsonaro contava com o respaldo de 80% da categoria quando saiu vitorioso das eleições nacionais de 2018.

“Hoje, o discurso é de desânimo”, admite. “Policiais civis, militares, federais, peritos e outros estão todos decepcionados”, acrescenta.

Nesta quarta-feira 17, integrantes da União dos Policiais do Brasil (UPB), que reúne 24 carreiras da segurança pública, farão uma carreata pela Esplanada dos Ministérios em Brasília. Na próxima segunda-feira 22, eles devem realizar manifestações em frente às unidades em que trabalham.

Segundo Boudens, a decepção da categoria com o presidente começou na tramitação da reforma da Previdência, aprovada em 2019. Na ocasião, o governo não incluiu policiais civis, rodoviários e federais no mesmo pacote dos militares, com regras mais brandas.

O estopim veio com a PEC Emergencial, que passou pelo Senado e pela Câmara dos Deputados. Os policiais, assim como todos os servidores, ficarão sujeitos ao congelamento salarial caso as despesas da União, de estados e municípios cheguem a 95% da receita corrente.

Em nota, a União de Policiais do Brasil manifestou um “profundo repúdio à forma como os servidores, dentre eles os profissionais de segurança pública, vêm sendo tratados”.

O abandono geral dos policiais ao governo, diz Boudens, poderá vir com a reforma Administrativa, que altera regras da estabilidade dos funcionários públicos e cria 5 tipos de vínculos com o Estado.

Antes da entrevista a CartaCapital, realizada na terça-feira 19, Boudens chegou a afirmar que “o que nós estamos vendo são ataques frequentes a um grupo a quem o governo deveria direcionar uma atenção maior”.

Leia a entrevista completa:

 

CartaCapital: A insatisfação da categoria se deve à PEC Emergencial?

Luís Antônio Boudens: A insatisfação vem desde a reforma da Previdência, pois nós pedimos uma similitude de tratamento com os militares. Eu me refiro a uma regra de transição justa, à pensão e à manutenção da integralidade e paridade.

O Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça já decidiram outras questões que equiparavam as forças de segurança pública às Forças Armadas.

O Bolsonaro, na época da Previdência, deu a ordem para as lideranças no Congresso e ministros para preservarem os policiais. O governo nos garantiu que teríamos o mesmo tratamento das Forças Armadas. Essa é a origem do nosso afastamento.

 

CartaCapital: Há um apoio amplo da categoria às manifestações?

Luís Antônio Boudens: O empenho nosso vai se virar contra a PEC 32 [reforma administrativa], que traz elementos que massacram ainda mais os policiais. Marcamos a carreata para demonstrar a nossa insatisfação, pois perdemos os direitos previdenciários. E ainda tem a questão dos reajustes vedados com a aprovação da PEC Emergencial.

 

CartaCapital:O presidente foi eleito em 2018 com amplo apoio da categoria. A que você atribui a diferença do discurso para a prática?

Luís Antônio Boudens: O peso da equipe do [ministro da Economia] Paulo Guedes se sobrepõe ao apoio da base que o Bolsonaro teve. Como presidente, ele tem a opção de aderir ou não à postura do Guedes.

O governo não encontra forças ou não quer [nos atender]. Se o presidente quiser manter um mínimo de apoio dos profissionais de segurança pública, ele vai ter que fazer essa revisão.

 

CartaCapital: Hoje, quanto de apoio ele ainda tem nas forças de segurança?

Luís Antônio Boudens:  Cerca de 80% dos profissionais apoiaram o presidente, mas agora o discurso é de desânimo. Hoje, o apoio gira em torno de 40%. Se a PEC 32 não trouxer garantias de direitos para os profissionais de segurança pública, o apoio deve chegar aos 20%.

Polícias civis, militares, federais, peritos e outros estão todos decepcionados. Após a PEC 32 não sobra apoio quase nenhum.

O Bolsonaro precisa ter uma posição política de defesa dos grupos que o apoiaram nas eleições, pois o eleitor votou nele e não no Guedes ou em qualquer ministro.

 

CartaCapital: A exigência de vocês, portanto, é uma equiparação com as Forças Armadas?

Luís Antônio Boudens: : Enquanto fomos abandonados na reforma da Previdência, os militares foram poupados e ainda ganharam uma reestruturação. O número de militares no Brasil é mais significativo do que os policiais. Para fins de cálculo previdenciário, seria mais viável nos atender. Para o Estado, seria mais barato apoiar o grupo da segurança pública em vez dos militares.

O pior efeito que você pode gerar em uma categoria como a policial é desmotivá-la. Ele [Bolsonaro] comete um erro gravíssimo.

OUTRAS NOTÍCIAS

Saúde mental dos policiais e a necessidade de mudanças urgentes

Exército reduz fiscalização de CACs em meio a disputa com PF no governo Lula

Policiais federais pedem aumento de efetivo para controle de armas

Há mais CACs do que policiais no país, diz Fórum Brasileiro de Segurança