Pesquisa mostra que 77% evitam sair à noite em Porto Alegre por causa da violência

Data: 02/02/18

Uma pesquisa, divulgada nesta quinta-feira  (1º), mostra como a violência afeta o comportamento dos moradores de Porto Alegre. Realizado pelo Instituto de Opinião Pública (IPO) e contratado pelo Instituto Cidade Segura, o estudo revela que 77,1% evitam sair de casa à noite e 72,5% procuram não portam dinheiro ou objetos de valor na rua.

A insegurança também faz com que a população evite andar de ônibus por receio de assaltos. A situação é percebida em 12,6% dos entrevistados, o que pode ter contribuído para a redução no número de passageiros.

Conforme o sociólogo e gestor do estudo Marcos Rolim, o medo da criminalidade faz com que espaços públicos deixem de ser ocupados.

— Quando as pessoas estão amedrontadas, elas alteram comportamentos. Não saem à rua, às praças. E essas regiões acabam ficando vazias e propícias para o crime. Estimular eventos na rua, é propositivo — considera Rolim.

O estudo foi financiado por três entidades representativas de policiais: o Sindicato dos Policiais Federais (SINPEF-RS), Sindicato dos Escrivães, Inspetores e Investigadores de Polícia (UGEIRM) e o Sindicato dos Policiais Rodoviários Federais (SINPREF-RS).

 Rolim explica que o trabalho é inédito na cidade e foi inspirado em estudos realizados nos Estados Unidos e Inglaterra.

— Em todo mundo mais desenvolvido, onde há políticas públicas de segurança, a pesquisa de vitimização é recurso imprescindível. Não tem como ter políticas públicas de segurança sem pesquisa de vitimização, porque a esmagadora maioria das vítimas não registram ocorrência, o que chamamos subnotificação — entende o pesquisador.

Segundo o estudo, 94,9% das vítimas de discriminação e 88,9% dos que sofrem assédio sexual em Porto Alegre nos últimos 12 meses não registraram ocorrência. A situação se repete em lesados no golpe do dinheiro falso (92,2%), por quem caiu em fraude no cartão de crédito (53,6%) e ainda para vítimas de roubo (41,5%) ou de furto (46,2%).

O sociólogo entende que o cenário é reflexo da baixa confiança da população nas polícias, civil e militar.

—Quando a população não confia, não informa à polícia. A coisa mais importante para o policiamento  não é arma, carro, mas informação — acredita Rolim.

Para fazer com que mais pessoas registrem ocorrências, o pesquisador entende que é preciso de uma polícia mais próxima da comunidade e uma mudança de postura dos agentes, para fazer com  que ganhem a confiança da população.

— As pessoas não registram porque acham que vão perder tempo e por terem medo de fazer registro. A polícia precisa de proximidade e de uma confiança maior. Quando o policial trata mal as pessoas, quando não considera o que ela está dizendo, está contribuindo para diminuir a confiança da população na polícia.

A intenção agora, após a divulgação da pesquisa, é apresentar o estudo para os candidatos a governador do Rio Grande do Sul.

— Nossa ideia é discutir um novo tipo de segurança —entende Rolim.

Procurada por GaúchaZH, a Secretaria da Segurança Pública (SSP) informou, por meio da assessoria de imprensa, que só se manifestaria em relação a pesquisas oficiais, como do Ministério da Justiça ou da Organização das Nações Unidas (ONU). Entre as justificativas, o órgão afirmou que desconhece a metodologia utilizada no estudo e a existência de uma portaria que impediria esse tipo de manifestação.

Metodologia

Para a 1ª Pesquisa de Vitimização de Porto Alegre foram entrevistadas mil pessoas acima de 16 anos, o que representa a 0,07% da população total da cidade. A coleta das informações ocorreu de 17 a 28 de outubro de 2017.

As entrevistas ocorreram em oito regiões da cidade, entretanto, não foram informados os bairros de cada morador. Conforme a socióloga Elis Radmann, evita-se divulgar dados nesse sentido para que "não haja leituras equivocadas".  No próprio estudo é apontado que para uma análise da realidade de cada região seria necessário uma "amostra muito mais expressiva".

A margem de erro da amostra é de 3% e seu grau de confiança é de 95%.

As entrevistas foram realizadas nas residências por duplas de pesquisadores de ambos os sexos, de forma a garantir que os residentes fossem abordados sempre por pesquisadores do mesmo sexo.

Indicador mostrou grau de confiança da população nas polícias

Um indicador mostrou o percentual de confiança dos moradores com o trabalho da polícia. A Brigada Militar ficou com índice de 49,2%, já a Polícia Civil 53,7%.

Para chegar no indicador, os participantes responderam a 11 questões. Entre elas, está a satisfação com o atendimento recebido — 34, 6% na BM e 38,4% na PC — e resolução de problemas: 43,7% na BM e 38,4% na PC.  Outra questionamento foi sobre os resultados contra o crime: 43,6% na Polícia Militar e 42,3% na Polícia Civil.

Os entrevistados também foram questionados sobre o perfil dos policiais. Sobre a preparação dos agentes, a BM recebeu nota 45,2% enquanto a PC 55,2%, já em relação à honestidade, a Polícia Militar obteve 63,0% e Polícia Civil 62,5%.

Além disso, os participantes tiveram que responder se os policiais não eram violentos. Para BM, o indicador ficou em 58,7% enquanto a PC obteve 72,4%.

Impunidade e mau exemplo de políticos como causas da criminalidade

Os participantes também foram indagados sobre as causas da criminalidade. Para 54,9% dos entrevistados, a situação está relacionada com o mau exemplo dos políticos e governantes. Em segundo lugar, com 42,1%, foi apontado a impunidade ou penas muito brandas.

Na sequência, 30% dos entrevistados marcaram "presídios superlotados que funcionam como escolas do crime" e outros 26,1% apontaram o tráfico de drogas.

Além disso, pouco mais da metade dos entrevistados relataram que seu bairro é "muito inseguro" à noite.

A partir disso, os participantes foram questionados das situações de insegurança. Do total, 42% relataram barulho de tiros e 12,4% disseram ser comum em seu bairro a presença de pessoas armadas com fuzil. 30,8% destacaram a existência de terrenos baldios na região; 26,2% a presença de brigas de rua e 24,2% sobre prédios, casas ou galpões abandonados.

Sobre o impacto da violência na rotina diária, 33,9% relatam "aguda ansiedade", outros 33,2% sentimento de pânico e 23% dificuldade para dormir.

Violência contra a mulher

A pesquisa também apresenta um recorte sobre a violência contra a mulher. Em relação a assédio sexual, 37,7% relatam que já ouviram comentários desrespeitosos de sentido sexual e 13,4% tiveram a experiência de alguém passar a mão em seus seios, nádegas ou órgão sexual sem sua autorização.

Além dessas, outras 7,5% das mulheres foram agarradas e/ou beijadas à força e 2,2% delas relataram que alguém tentou se aproveitar delas quando estavam alcoolizadas.

Também foram detalhados os casos de assédio sexual em meio de transporte. Ao longo das suas vidas, 35,1% das entrevistadas relataram ouvir comentários de intenção sexual durante deslocamento. A maior parte das situações (79,3%) ocorreu em ônibus, 17,1% em serviços por aplicativo e 5,9% em táxis.

Além do assédio sexual, os participantes foram questionadas sobre situações de estupro. Ao longo de suas vidas, 3,7% das pessoas relatam terem sido vítimas, o que atinge quase que exclusivamente as mulheres.

Entre as que sofrem esse tipo de violência, 37,8% relataram um caso, mas 29,7% contaram que foram vítimas duas vezes.

Fora isso, uma parte dos participantes do estudo entende que as mulheres são culpadas por terem sido estupradas. A resposta veio a partir da pergunta: "há situações onde algumas mulheres se comportam de tal forma que é como se estivessem pedindo para serem estupradas". O questionamento integra a seção "afirmações polêmicas" do estudo (veja abaixo). Ao todo, 37% concordaram e 63% discordaram.

O curioso é que 40% dos que consentem com a afirmação são mulheres, contra 35,5% de opinião masculina.

Afirmações polêmicas

Os participantes também foram confrontados com 12 afirmações polêmicas e, a partir delas, precisaram demostrar se concordavam ou não.

Apenas uma delas atingiu o índice de 90% de aceite. Na frase, era apontado que uma das soluções para reduzir o número de crimes seria assegurar os direitos das crianças e dos adolescentes, garantindo escola de qualidade e alternativas de lazer e cultura. Apenas 7,9% discordaram.

A pesquisa também aborda a liberação do uso de armas pela população e tenciona que haveria mais mortes caso houvesse autorização. Ao todo,  63,9% concordaram  e 36,1% negaram.

Outra situação hipotética apresentada era a possibilidade de tortura de suspeitos de crimes pela polícia para que eles revelassem informações importantes.  Do total, 64% fizeram objeção e 36% aceitaram.

Ainda sobre criminosos, é apresentado que não haveria problema da polícia matá-los caso fossem enquadrados no perfil de "perigosos" e estivessem presos. Ao todo 52,9% concordaram e outros 47,1% discordaram.

Fonte: Diário Gaúcho

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